O exame chamado FAN, sigla para fator antinuclear, é um
teste habitualmente solicitado para os pacientes que estão com suspeita de uma
doença autoimune. Normalmente, o sistema imunológico responde à invasão do
nosso organismo por patógenos produzindo um grande número de anticorpos para
combatê-los. No entanto, quando uma pessoa tem uma doença autoimune, o
organismo inapropriadamente passa a produzir anticorpos contra células, tecidos
e proteínas do próprio corpo.
Doenças
autoimunes:
Doenças autoimunes são aquelas no qual o nosso sistema
imunológico equivocadamente deixa de reconhecer algumas das estruturas
presentes no nosso corpo e passa a tratá-las como se fossem agentes invasores
nocivos à saúde. Um dos indicativos da presença de doença autoimune são os autoanticorpos. Um autoanticorpo é um anticorpo
produzido pelo sistema imune que atua contra componentes do
próprio organismo que o produziu, por exemplo contra o DNA, RNA e contra
outras proteínas contidas no complexo de proteínas / ácidos nucleicos. É
importante mencionar que nem todos os autoanticorpos causam doenças, afinal a grande maioria dos indivíduos normais
produzem autoanticorpos, embora em pequenas quantidades.
Lúpus Eritematoso Sistêmico, um exemplo de doença autoimune |
Fator
Antinuclear (FAN):
O FAN (fator antinuclear) é um grupo de autoanticorpos
descobertos na década de 1940 em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico. O
FAN não é um único anticorpo, ele é um conjunto de anticorpos contra diferentes
estruturas das células. Existem vários tipos de FAN, cada um deles associado a
um tipo de doença autoimune diferente. Por exemplo, os Autoanticorpos Anti-DNA Nativo ou de Dupla Hélice
(dsDNA) estão presentes exclusivamente no soro de
pacientes com Lupus Eritematoso Sistêmico, sendo, portanto, úteis no
diagnóstico diferencial da doença desde que detectado por um teste de alta
especificidade.
É importante salientar que 10% a 15% da população sadia
pode ter FAN reagente em valores baixos, sem que isso indique qualquer problema
de saúde. Não se sabe o porquê deste fato, mas a simples presença de um FAN
positivo não é suficiente para o diagnóstico de nenhuma doença.
Exame
FAN:
O exame de FAN é feito com amostras de sangue do paciente
com suspeita de doença autoimune. No laboratório consegue-se identificar todos
os anticorpos circulantes neste sangue. Com um corante fluorescente o
laboratório marca cada um destes anticorpos. Depois, mistura-se este sangue em
um recipiente com uma cultura de células humanas chamadas de Hep2.
O resultado é o que se vê na foto abaixo. Se houver
anticorpos contra células do próprio organismo, estes irão se fixar às mesmas,
tornando-as fluorescentes. Se o auto-anticorpo for contra o núcleo das células,
a imagem no microscópio será de vários núcleos fluorescentes. Se auto-anticorpo
for contra o citoplasma das células, vários citoplasmas ficarão brilhando, e
assim por diante. Se não houver auto-anticorpos, nenhuma parte das células
ficará fluorescente, caracterizando um FAN não-reativo
FAN Reativo |
Os resultados são repetidos após várias diluições do
sangue, até a fluorescência desaparecer. Resultados positivos são aqueles que
permanecem brilhando mesmo após 40 diluições (resultado 1/40 ou 1:40).
Portanto, um FAN reagente 1/40 significa que o auto-anticorpo foi identificado
mesmo após o sangue ser diluído 40 vezes.
Aproximadamente 10% da população possui FAN positivo,
geralmente nas diluições menores que 1/80. Isto significa que só são
valorizados valores a partir de 1/160. As diluições são normalmente feitas
na seguinte ordem: (1/40), (1/80), (1/160), (1/320), (1/640), (1/1280)… Valores
maiores ou iguais a 1/320 são muito relevantes e indicam doença autoimune em
mais de 97% dos casos.
Existem mais de 20 padrões diferentes de Imunofluorescência. Cada um
descreve o modo como as células humanas foram coradas pelos anticorpos
fluorescentes. Alguns padrões são típicos de doenças, como Lúpus,
esclerodermia, artrite reumatoide e síndrome de Sjögren. Outros são
inespecíficos e podem estar presentes em pessoas normais.
Os padrões mais comuns do FAN e suas prováveis patologias, são:
Nuclear pontilhado Centromérico =
Esclerodermia ou Cirrose biliar primária.
Nuclear homogêneo = Lúpus, Artrite Reumatoide,
Artrite Idiopática Juvenil, Síndrome de Felty ou Cirrose Biliar Primária.
Nuclear tipo membrana nuclear contínua = Lúpus
ou Hepatite autoimune.
Nuclear pontilhado fino = Síndrome
de Sjögren Primária, Lúpus Eritematoso Sistêmico ou Lúpus.
Nuclear pontilhado fino Denso =
Inespecífico, pode estar presente em várias doenças auto-imunes e também na
Cistite Intersticial, Dermatite Atópica, Psoríase ou Asma.
Nuclear pontilhado grosso = Doença
Mista do Tecido Conjuntivo, Lúpus Eritematoso Sistêmico, Esclerose Sistêmica ou
Artrite Reumatoide.
Nucleolar pontilhado =
Esclerose Sistêmica.
Citoplasmático pontilhado reticulado = Cirrose
Biliar Primária ou Esclerose Sistêmica.
Citoplasmático pontilhado fino =
Polimiosite ou Dermatomiosite.
É preciso saber interpretar os resultados do fator antinuclear. Um mesmo
padrão pode significar várias doenças autoimunes diferentes ou não significar
nada. O FAN precisa ser avaliado junto com o quadro clínico do paciente. É
importante lembrar que o paciente é um todo e não apenas um resultado de uma
reação química impresso em um pedaço de papel. As associações descritas acima
são possibilidades e não fatos consumados.
Falsos
Positivos no Exame FAN:
Como qualquer exame laboratorial, o FAN também pode
apresentar falsos positivos. 10% da população saudável pode ter FAN falso
positivo, principalmente mulheres e idosos. Algumas doenças ou medicamentos
também podem causar um FAN reagente, sem que isso signifique a presença de uma
doença autoimune. Entre as doenças, as mais comuns são: HIV , mononucleose,
linfoma e tuberculose Entre os medicamentos, os mais comuns são: hidralazina,
isoniazida e procainamida.
Uma vez que se tenha um FAN positivo, associado a um
quadro clínico que sugira doença autoimune, deve-se solicitar a pesquisa de
autoanticorpos específicos para tentar definir exatamente com qual doença
autoimune estamos lidando. O FAN sugere a presença de um autoanticorpo, mas não
define qual. Por exemplo, um FAN sugestivo de lúpus indica a pesquisa do
Anticorpo anti-DNA nativo, que , como dito anteriormente, é o autoanticorpo
típico desta doença; já na suspeita de Sjögren solicita-se o anticorpo anti
SS-A/Ro e anticorpo anti SS-B/La; na Esclerodermia dosa-se o anticorpo
anti-centrômero...
Muitas vezes o paciente tem o FAN positivo mas possui os
autoanticorpos específicos, citados acima, negativos. Nestes casos há
geralmente duas possibilidades: ou o FAN é falso positivo ou o paciente pode
ter uma doença autoimune que ainda não está ativa. Há
pacientes com lúpus que apresentam o FAN reagente anos antes da doença se
manifestar clinicamente. Há outros, porém, que têm FAN positivo para o resto da
vida e nunca desenvolvem nenhum problema de saúde.
Às vezes, o verdadeiro diagnóstico não é aquele você imaginava... |
Fontes:
http://www.mdsaude.com/2009/05/o-que-e-o-fan-fator-antinuclear.html
http://www.reumatoguia.com.br/interna.php?cat=37&id=130&menu=37
http://www.medicinanet.com.br/conteudos/revisoes/2496/exames_laboratoriais_%E2%80%93_autoanticorpos.htm
Enfim, encerro aqui mais uma série de postagens. Eu admito que gostaria de ter ampliado e abrangido mais o assunto desse blog, visto que, a meu ver, é um tema muito amplo e interessante. Infelizmente devido ao número reduzido de postagens, esse fato não foi possível. Entretanto, espero ter contribuído de alguma forma positiva no conhecimento de meus leitores (comentadores + avaliadores) no campo da imunologia e da bioquímica e ter provado a importância das mesmas para o nosso querido curso de medicina. Muito obrigado e até mais!